Estou bem acompanhado...!

sábado, 18 de junho de 2011

Ser família

Ser família
É um fenómeno. As famílias são um fenómeno. Ser família é um dom impressionante, talvez pela sua simplicidade. Por mais ou menos unidas que pareçam, são sem dúvida a base sólida para toda a nossa vida. E é, ao mesmo tempo, a nossa missão e a nossa sorte tê-la e poder cultivá-la...
No entanto, torna-se preocupante a frequência com que asseguramos que “hoje em dia as coisas são diferentes”, numa crença inabalável de que ser família já não é como era antigamente. Fogem-nos estas ideias porque a sociedade o exige…Mas também temos de exigir mais de nós!
Daí que o título deste texto seja “ser família”. Talvez se eu fosse mais extremista acrescentaria a expressão “Aprender a…”. Não o fiz, por um lado, porque não acho que seja preciso ensinarmos ninguém sobre o valor da família. Podemos gostar mais de um primo do que de outro, mas nunca nos esquecemos de nenhum. E por outro lado porque aprender implica falhar. Se o menino nunca largar a mão da Mãe por não querer correr o risco de cair de rabo no chão da sala, nunca vai andar “bem”, sozinho. Por isso, esta não é uma lição de vida. Quem me dera achar sequer que poderia ensinar algo a alguém! Estas linhas são apenas ideias de um filho que faz estupidezes todos os dias…
Aos filhos:
- Tudo o que se aprende quando crescemos vem de tudo o que nos rodeia. A vantagem de ter 20 anos é a de que ainda temos – ou devemos ter - “pachorra” para ouvir coisas novas, para discutir assuntos difíceis, para levar descomposturas dos outros. Talvez aos 70 anos já seja aceitável que essa “aptidão” esteja arrefecida. Ao mesmo tempo, as idades “verdes” são fenomenais. Faz-se o que se quer porque se vai ganhando essa confiança e “liberdade”. Lembro-me que adorava dormir em casa dos meus primos… mas só podia lá ficar se tivesse os trabalhos de casa feitos! O que é que isto não tem de fenomenal? Eu cumpro a minha parte, e o negócio é praticamente garantido!
É nesta idade que dá gozo, também, fazer estupidezes… E esta é a melhor parte. Podemos falhar, falhar, falhar, falhar! Fica tudo furioso, mas azar! “Estou no meu direito!”
Só há aqui um “pequeno” ponto. As estupidezes que se fazem não podem sobrepor-se àquilo para o qual fomos educados. Se o meu erro me vai fazer tropeçar na educação que tenho, não posso deixar. Consegue-se combater tudo menos a consciência; e essa quando pesa… pesa muito! Não há nada pior do que quebrar a confiança da mãe ou do pai. É humilhante e vergonhoso… é como ser apanhado a roubar chocolates no Continente. Sem sequer falar do facto de que isso, pura e simplesmente, não se faz! É tão bom sentir que fizemos a nossa parte e ao mesmo tempo nos pudemos descuidar nalguns momentos! Mas fraquejar em assuntos-base e atrofiar só pelo medo de perder alguns “amigos” é tão errado…tão discrepante…!

Ser filho é bestial; muito mais ainda nos dias de hoje. É fenomenal ver que os mais velhos se preocupam connosco, e ver que os mais novos nos querem como exemplo. Guiamos e somos guiados. Fazemos companhia e sentimo-nos acompanhados! A nossa função principal é… estar. Simplesmente estar. Não desaparecer, não achar que os outros grupos são mais importantes, que precisam mais de nós. Não há ninguém que precisa mais de nós do que aqueles que nos criaram…Ser família é sermos um corpo presente, constante; e se tivermos a noção de que a nossa opinião e participação nas questões familiares têm um valor insubstituível, já demos um grande passo. Resta só ir buscar esta “pachorra” para estarmos e sermos um corpo presente…ao nosso passado; talvez à altura em que não sabíamos andar… aí, todos tiveram “pachorra” para nós!
Aos pais:
- A posição por si só é vantajosa! A alegria de se ser pai é maior ainda do que a de ser filho! E Não é um fardo, é um cargo. É um estatuto que se assume e que se quis assumir e, por isso, é nosso. É uma relíquia que ninguém nos pode tirar, e é - provavelmente – a melhor sensação do mundo! Por isso, qual é a ideia de não a viver diariamente? E qual é o drama em vivê-lo, diariamente, com “ganas”? Antigamente, é que era dramático! Ver um filho partir para a faculdade e só voltar a falar com ele se ele quisesse responder à nossa carta… Irra! Que drama!
Agora? Estão tão perto… E querem estar perto dos pais! Como é natural, vão querendo “afastar-se” à medida que crescem, à medida que podem ter mais “liberdade”. Mas não há nada melhor para um filho do que voltar para casa. Sentir companhia! Não há nada melhor do que estar em casa e poder falar com o pai e a mãe sobre o dia, sobre os estudos, sobre as “noitadas”, sobre os namoros e sobre… sobre tudo. Faz parte! E este incentivo pode e tem de partir, não só mas também, daqueles que gerem este negócio da família!
Peço que não tomem estas linhas como uma tentativa de encontrar verdades supremas. Não o são nem por sombras. Sinto, pelo que vejo!
Sinto, pelo que vejo, uma pequena pedrinha no sapato das famílias, e que “baralha” as cabeças dos pais e dos filhos: a falta de limites. Não há nada de mal em cortar as asas a algumas asneiras ou “tiques” dos filhos… aliás, é essa a grande dificuldade e a grande missão dos pais! É importante que eu, como filho, saiba que tenho limites, e que conheça os meus limites. Enquanto vivo no mesmo tecto que os meus pais, ou entro no jogo como eles o delimitaram, ou então não jogo – e saio de casa, e vou viver para não-sei-onde. É duro, mas não é assim tanto. É a razão de ser da casa de família. Se eu vou a casa de um amigo e ele me diz que eu não posso falar alto, eu não vou falar alto – porque conheço os meus limites. Então, se os meus pais me disserem “menino, não se berra”, porque raio hei-de eu dizer que “faço o que eu quero!”? E se o disser, talvez então a resposta tenha de vir acompanhada de um castigo ou de uma “puniçãozita”… faz parte do jogo! Por isso resta que o juiz saiba colocar bem as regras em cima da mesa e as saiba cumprir! De resto, basta simplesmente… estar. Estar, e desfrutar!
Falar de um pai que ama um filho não é tabu. O que é difícil, para um filho, é perceber o que é que uma palmada tem de amoroso! Para isso, basta que o filho sinta no pai um confidente, o primeiro poiso, um corpo presente – e estável. Maior drama do que o filho fumar talvez seja não contar ao pai que o faz (se tiver idade!). Ao mesmo tempo, confiar cegamente em alguém implica, incondicionalmente, muitas horas de conversas, muita cumplicidade, muitas “dicas”… Não é possível eu contar a minha vida a alguém com quem nunca falei sobre nada sério! Eu tenho de sentir que é uma conversa saudável, que me ajuda ou que me leva a tomar uma decisão que parecia mais difícil. Para isso, a receita – e repito-me irritantemente muito – é simples: é Estar!
E é tão bom fazer parte de uma família. E digo-o porque adoro. Digo-o porque em todas as famílias se fala a mesma língua e não nos arriscamos a fazer “partes-gagas”.

E digo-o porque adorava ver – e sentir – que há mais famílias a viver assim; com mais ou menos dramas, mas assim… Que há mais gente, como eu, ansiosa por cultivar cada vez mais este Dom!

1 comentário: